1 de Janeiro 2023

Já te dou o arroz

O Prémio de Empreendedorismo e Inovação CA distinguiu, em 2022, o projecto AlertaARROZ. Tudo por ‘culpa’ de um nemátode que, detectado em Itália, constitui séria ameaça aos arrozais europeus: pode causar até 80% de perdas nas colheitas e, num cenário pontuado pelas alterações climáticas, todo o cuidado é pouco. A equipa de investigadores premiada lançou mãos à obra para evitar a dispersão do perigoso fitoparasita no território, apostando na capacitação dos agricultores no campo da prevenção e controlo da praga

Quarto maior produtor de arroz a nível europeu, Portugal regista um consumo per capita quatro vezes superior à média da União Europeia – dá nota a Agência Lusa citando a Associação Nacional dos Industriais de Arroz (ANIA). A mesma fonte avança que as tipologias predominantes à mesa dos portugueses, segundo dados de 2021, são lideradas pelo arroz agulha (46,8%), bem destacado face ao carolino (21,9%), basmati (13,7%) e vaporizado (10,7%). Acresce, na leitura dos grandes números, que em 2022 Portugal exportou 56,9 toneladas de arroz (+71,9% face ao ano anterior), ao passo que as importações atingiram as 97,2 ton. Tudo isto explica a relevância da fileira do arroz e, noutra latitude de análise, a importância-chave de projectos como o AlertaARROZ, vencedor, em 2022, do Prémio Empreendedorismo e Inovação Crédito Agrícola, categoria “Promoção da Inovação”. O AlertaARROZ tem a assinatura da equipa de investigação do Laboratório de Nematologia (NemaINIAV) na esfera de competências do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV). Este projecto está focalizado nas diferentes implicações do nemátode das galhas radiculares do arroz (Meloidogyne graminicola, Mg), fitoparasita detectado pela primeira vez em 2016, em Itália. No elenco dos seus objectivos sublinha-se o propósito de “minimizar o impacto da entrada e dispersão de Mg nas zonas produtoras em Portugal” e, de caminho, “alertar a fileira e dotar os intervenientes de conhecimento para uma corresponsabilização das acções a tomar, nomeadamente no desenvolvimento de métodos de early detection, seguidos de técnicas de fast diagnóstico precisas e robustas e in situ”.

Fala quem sabe, neste caso a responsável pelo NemaINIAV, Maria de Lurdes Inácio. Na prática, a inovação passa pela aposta na prevenção: “um produtor informado é um produtor protegido e o conhecimento transmitido à fileira e a possibilidade de detectar precocemente esta ameaça minimizarão os danos que possa vir a causar no sector”. A responsável pelo NemaINIAV faz notar que a introdução de uma agricultura preventiva de precisão, com detecção precoce e técnicas de diagnóstico rápidas e precisas, permitirá minimizar o impacte económico da entrada (inevitável) de Mg no País. Esmiuçando o histórico do projecto AlertaARROZ, o fitoparasita de que falamos foi incluído em 2017 – um ano depois de detectado – na Lista de Alerta da Organização Europeia e Mediterrânica para a Proteção das Plantas (EPPO/OEPP). “Este foi, de facto, o primeiro sinal de alerta”, sublinha Maria de Lurdes Inácio, acrescentando que a preocupação tem vindo a aumentar nos últimos tempos com a certeza de que a doença não foi erradicada: “muito pelo contrário, têm ocorrido em Itália novas detecções de Mg, apontando para um grande potencial de dispersão do nemátode nos países europeus produtores de arroz”. Assim se explica a pertinência – e a emergência – do AlertaARROZ. Uma ideia que resultou em linha de investigação prioritária no NemaINIAV, entidade que assumiu entretanto a coordenação de um projecto internacional sobre o tema, sendo ainda de destacar um doutoramento especificamente dedicado. Antecipando os próximos passos, o enfoque será agora na sensibilização de produtores e players do sector orizícola, alertando-os para o risco de disseminação de Mg em Portugal, através de um plano de comunicação coordenado pela Lusosem e o COTArroz, a iniciar já nesta Primavera e cuja abordagem incidirá nos sintomas, colheita de amostras e impacte expectável da entrada de Mg no nosso país. “Em simultâneo, realizámos a prospecção de nemátodes nos arrozais das diferentes bacias produtoras de arroz e temos projectos de investigação nesta temática com diversas entidades do espaço europeu, Austrália e Brasil, além da publicação de artigos técnicos e notas de alerta nos principais meios de comunicação ‘agro’, sem esquecer o envolvimento das redes sociais e a aposta em citizen science”, refere Maria de Lurdes Inácio. Sobre a conquista do Prémio CA, a responsável pelo NemaINIAV considera que parte do objectivo do projecto fica desde logo cumprida, ao despertar imediatamente a fileira para a ameaça muito real deste fitoparasita” – que o mesmo é dizer: AlertaARROZ!